Recursos Humanos e a geração “show me the meaning”

 

Em visita recente à uma consultoria de conteúdo, contei do meu mais novo desafio: sair de uma multinacional e seguir para uma startup de criptomoedas. Foi quando ouvi um comentário que ficou ressoando em mim: “Não queremos mais o ‘show me the money’. Agora é ‘show me the meaning'”.

Os fãs de filmes da década de 1990, assim como eu, devem se lembrar de Jerry Maguire: A Grande Virada, que é um daqueles filmes que marcou uma geração. Ele reflete como um trabalho que traz status e alta remuneração também pode proporcionar ausência de propósito, além de mostrar o lado quase perverso do “Show me the money”, não como meio, mas como fim. Teimosos que somos, essa mesma geração (me incluo nessa) foi para o mercado de trabalho, e fomos Jerry Maguire: focamos primeiro em nos erguer financeiramente.

Lembro quando participei de um processo seletivo para uma grande empresa e um dos sócios me questionou se eu estava pronta para doar os melhores anos da minha vida, pois seria recompensada como em nenhuma outra empresa. A resposta foi “sim”, com a mesma certeza que trabalhei lá por três anos, sem nunca entrar depois das 8h e sair antes das 22h. Show me the money! E mesmo com uma alta remuneração, não sentia que era o suficiente para tudo que eu estava abrindo mão ao estar ali. Mas nunca me arrependi, foi a minha melhor escola e me proporcionou grandes amigos. Mas sentia que faltava algo.

Acredito que a questão do propósito chega, de uma forma ou de outra, em momentos diferentes. Tenho uma amiga que saiu de uma empresa com cargo público e voltou para a faculdade, enquanto também atua como consultora independente. Outro amigo saiu de uma consultoria multinacional renomada e foi para uma startup de mobilidade. É cada vez mais comum vermos pessoas com empregos estáveis saindo da zona de conforto e voltando aos estudos, trabalhando por conta própria ou apostando as suas fichas nas ideias inovadoras de uma startup.

Essas pessoas normalmente têm em comum o fato de já terem provado suas qualidades em suas áreas, mas em determinado momento surge a pergunta: “E agora?”. Há duas opções: ou permanecemos onde estamos ou podemos nos inquietar e seguir nosso instinto de buscar algo a mais. Ambas opções são válidas, pois é uma questão de perfil, mas nenhuma delas é fácil. Toda decisão envolve uma tomada de risco, e dá medo.

Os questionamentos sobre a decisão podem surgir logo no primeiro dia ruim de trabalho, e se repetem. Mas isso é bom! Questionamentos nos levam para um patamar de consciência mais amplo, mudando a nossa perspectiva de mundo, felicidade e propósito de forma rápida. Os impactos positivos dessa virada de chave são sentidos na sequência.

Atuando hoje em uma startup de criptomoedas, começo a ver isso mais de perto. Há uma grande demanda por profissionais altamente qualificados, que geralmente estão nas grandes empresas. E, como em toda startup, o sonho é grande, o propósito é claro, mas a grana é curta e você terá muito trabalho. Mesmo assim, estamos atraindo excelentes profissionais, pois a maioria é movida pelo nosso propósito: mudar a relação das pessoas com o dinheiro, desafiar o sistema atual e se desafiar. E para isso eles abrem mão de estabilidade, status e do “Show me the money” como fim.

Marcelo Madarasz (ex-Natura, atual diretor de RH da Parker Hannifin) disse certa vez em uma palestra, que não precisa ser “uma coisa ou outra, pode ser uma coisa e outra”. Ou seja, a remuneração coerente com o mercado é importante e não deve ser excluída dessa equação.

Acredito que nossa geração hoje começa a ter mais clareza que ter um propósito no que faz é tão importante como ser remunerado de forma coerente. E este é o desafio que se apresenta para as startups que precisam continuar a crescer. Por isso, é importante que todo desenho de estrutura seja feito de forma cautelosa e igualmente coerente.

“I couldn’t escape the simple thought that I hated myself, no that’s not it, I hated my place in the world.”. Ou, traduzindo: “Eu não podia escapar da simples ideia de que eu me odiava. Não, não é isso. Eu odiava o meu lugar no mundo”.

Já se sentiu assim? Seja bem-vindo ao “clube”, você é mais um Jerry Maguire! A boa notícia é que não estamos mais em 1996. Esse movimento de busca de sentido já é mais fácil e reconhecido pelo mercado.

Fonte: Administradores

10 de outubro de 2018